A tela

Ouvia-se um som áspero a rabiscar uma folha de papel. A folha, que anteriormente era branca estava a ficar preenchida por aquilo que uma criança chamaria de desenhos ou bonecos, pois para ela, não era muito diferente da sua imaginação projectada numa folha de papel.

Na verdade, essas figuras que tinham agora transformado a personalidade da folha de papel, eram notas. Notas que não eram apontamentos, embora fossem notas que talvez um dia valessem dinheiro, pois Ângela, embora gostasse de escrever os seus pensamentos e gostasse de desenhar, hoje ela escrevia notas para uma música inspirada pelo pássaro colorido que a tinha acordado pela manhã.

Também, o rio que apressadamente tinha passado pelo jardim de Ângela depois de ter servido de comida para um belo e jovem cavalo, de ter servido de alimento a vários campos de milho e ter acolhido um jovem que nele quis tomar banho pela manhã, se tornou fonte de inspiração artística não só para Ângela que agora dedilhava a sua bela harpa mas também para um pintor que protegia a cabeça com uma boina enfeitada com uma pena vermelha.

O velho pintor que sabiamente partilhava a sua experiência de vida na tela, sentava-se com frequência por cima da ponte por onde passavam os aguadeiros que traziam água do fosso para a aldeia. Nesta celeste manhã, o experiente senhor pintava um castelo dentro de uma bolha de sabão. Não que o castelo tivesse uma fraca muralha, não era nada disso. Naquela tela, Natércio estava a pintar as muralhas das pessoas que tinha encontrado ao longo da sua vida. Sim, ele também a si próprio, se tinha encontrado.

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